Infância…

As multifacetas da infância: um olhar interpretativo de uma turma de pedagogia

 

Por: Aline Mello¹, Camila Dias¹, Carolina Badaró¹, Gabriela Morais¹, Gleice Costa¹, Kelly Rocha¹ e Valquíria Rezende¹.

 

¹ Graduanda um Pedagogia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).

O primeiro dia de aula do componente curricular Educação Infantil, sob a orientação da professora Marlene dos Santos, do 5º semestre da Universidade Federal da Bahia, do curso de Pedagogia, foi iniciado com uma dinâmica, na qual cada discente deveria apresentar um conceito para seis palavras chaves apresentado pela docente, sendo elas: CRIANÇA, INFÂNCIA, EDUCAÇÃO INFANTIL, CRECHE, PRÉ-ESCOLA E BRINCADEIRA. Após a realização da dinâmica a turma foi dividida em seis grupos, tendo por finalidade ler e analisar os conceitos, elaborar um conceito síntese e ampliar esse conceito com base em teóricos presentes no plano da disciplina. Além disso, o trabalho apresentava uma dimensão estética, visto que a cada equipe foi designado o nome de um pintor e/ou poeta, com o qual deveria relacionar o conceito. O grupo responsável por esse texto analisou a palavra chave Infância e a partir dos 34 conceitos apresentados pelos discentes, foi possível detectar a presença de quatro concepções de infância.

A primeira concepção vê a infância como fase ou etapa da vida. Momento de transição da criança para a vida adulta, sendo, portanto um período da vida pela qual todos os seres humanos passam. Essa visão não leva em conta os aspectos sociais, econômicos que faz com que muitas crianças sejam arrancadas da sua infância antes de se “tornarem” adultas.

Historicamente, essa visão de infância surge na Idade Média, através do conceito de “Idades da Vida”, que separava a vida em seis etapas e/ou fases. Dentre essas fases, a primeira correspondia ao período que vai do nascimento aos 7 anos de idade. A palavra infância é originaria do latim infantia, e significa “incapacidade de falar”. Acreditava-se que a criança, antes dos 7 anos, não possuía a habilidade de se comunicar através da fala, de explicitar seus desejos, suas inquietudes,  seus sentimentos. Tratava-se de um ser incógnito, sem evidência na sociedade. Quando as crianças eram representadas através de pinturas, elas eram frequentemente retratadas numa perspectiva de um adulto em miniatura. Arroyo (2013) é contrário a essa concepção, e defende que a infância se caracterizava como etapa etária de cuidados e que, no entanto, uma idade não está em função de outra idade, já que para ele, cada tempo da vida tem sua especificidade e demanda uma educação própria e não enquanto preparo para outra fase.

A segunda concepção vê a infância como momento mágico, lúdico onde as crianças não têm preocupações nem responsabilidades comuns à vida adulta, sendo o momento de “viver a vida de forma descontraída, sem preocupações”. Com base nessa visão, a infância não é vista como período significativo e a brincadeira está presente, mas não representa um momento relevante. Essa visão de infância caracteriza a criança como um ser inacabado, imperfeito, vazio.

Segundo Sônia Kramer, a área da Filosofia vê e constrói uma representação de infância como um período onde a criança não é guiada pela razão, e consequentemente, precisa ser guiada pelos adultos. Dentre os estudiosos da Filosofia podemos destacar Immanuel Kant que defende que o papel da educação é fazer a criança sair do mundo dos desejos (infância) para o mundo da razão. De acordo com Kramer, estas características expressam as relações entre a criança e o adulto em um âmbito social, político e econômico onde a criança é rejeitada, marginalizada, afastada do mundo de “gente grande”. Nesta concepção, percebemos na fala dos sujeitos que “viver a vida de forma descontraída e sem preocupações” está intimamente relacionada com o equívoco em pensar na criança a partir do que sabemos o que é ‘ser adulto’. Neste caso, há uma tentativa em afirmar que o ser humano deve ser guiado pela razão, pelo discernimento e como a criança é compreendida ainda sem este tal “discernimento”, portanto ela deve ser guiada e ensinada pelo adulto a se preparar para uma fase posterior, onde ela de fato fará uso de sua razão.

Mas, como chegar até aqui falando de infância sem recorrer a Manoel de Barros, poeta que se preocupou em dá voz para as crianças, que estavam/estão à margem da sociedade? Barros em suas obras nos ensina que:

É um olhar para o ser menor, para o insignificante que eu me criei tendo. O ser que na sociedade é chutado como uma barata- cresce de importância para o meu olho. (Barros, 1998, p.27).

E é com esse olhar que nos deparamos com a terceira concepção que relaciona a infância a um momento de construção, formação, desenvolvimento onde a criança através das descobertas de si e do mundo se constitui enquanto sujeito dotado de identidade, personalidade, caráter. Nessa visão a infância é relacionada a um período singular e significativo, no qual a brincadeira é vista como momento de experimentar de se relacionar com seus pares.

Manoel de Barros entende que a criança é como o Poeta, pois ambos se utilizam da linguagem para ampliar o mundo vivido e imaginado. Nesse sentido o poeta concebe a infância como momento de inquietude, de reconstrução do mundo, de significações. E é nas brincadeiras que a criança imagina, cria e se desenvolve, e nos seus poemas Barros, reflete sobre essa capacidade que a criança tem de se relacionar, de criar seus jogos, seus significados sem precisar da intervenção dos adultos.

A quarta concepção estabelece uma visão da infância como uma etapa onde a criança é entendida como ser histórico-social de direitos e deveres respeitados, sendo essa visão defendida na atualidade. Segundo Arroyo (2013), a infância está relacionada ao papel da mulher na sociedade, e quando esta se insere no mundo do trabalho a infância se constitui como categoria social, e consequentemente como sujeito público e social de direitos. Apesar de essa ser a concepção mais discutida atualmente, podemos perceber que a maioria das pessoas defende as visões anteriores em detrimento dessas, e isso se reflete entre os discentes do componente em curso, visto que dentre 34 conceitos de infância, apenas um abrange esses aspecto: “Infância: direitos e deveres respeitados.”.

Legalmente falando, essa concepção de infância surge no século XX a partir da criação de documentos e/ou instituições relacionadas à infância, dentre eles estão o Fundo das Nações Unidas (UNICEF- criado em 1950 com a finalidade de promover o bem estar da criança e do adolescente em suas necessidades básicas); a Declaração dos Direitos da Criança (criada em 1959 pela ONU); a Constituição Federal de 1988, que assegura em seu Art. 227 à criança e ao adolescente o estado de sujeitos de direitos; e o Estatuto da Criança e do Adolescente (instituído pela Lei 8069/90) que “reassegura” os direitos da Criança e do Adolescente, e consequentemente a Infância como período que tem seus direitos devidamente reservados.

A partir das concepções analisada pode-se perceber que o conceito de infância está vinculado a historia que os sujeitos trazem consigo e é a partir dessa historicidade relacionada com os teóricos que foram mencionados no decorre do texto que se conclui que para a turma do 5º semestre do curso de Licenciatura em Pedagogia, a Infância é a primeira etapa da vida onde a criança forma sua identidade, caráter, através das descobertas de si e do mundo. Nesse processo a criança desenvolve-se biologicamente e cognitivamente por meio das experiências e brincadeiras, desde que tenham seus direitos respeitados e preservados.

 Arroyo (2013), afirma que a infância não é algo estático, é algo que está em permanente mudança a depender do contexto social, político, econômico em que está inserido. Por tais motivos não é aconselhável referir-se a “infância” como única, devemos sim compreender as “infâncias” diversas em seu tempo e sua realidade. Já para Manoel de Barros, a Infância é uma construção social, que não se encerra quando da vida adulta, mas que permanece presente através da imaginação, da fantasia, da lembrança dos “cheiros da Infância”:

 

REFERÊNCIAS:

KRAMER, Sonia; HORTA, José Silvério Baia. A idéia de infância na Pedagogia contemporânea. Disponível em: <<http://emaberto.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/2140/1408>>. Acesso em: 01 de junho de 2013.

LOPES, Lindicéia Batista de França; SILVA, Irizelda Martins de Souza e. Concepção de infância: uma busca pela trajetória do Legalizado. Disponível em:  <<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/25/art11_25.pdf>>. Acesso em 06 de junho de 2013.

NASCIMENTO, Cláudia Terra do; BRANCHER, Vantoir Roberto; OLIVEIRA, Valeska Fortes de. A construção social do conceito de infância: Algumas interlocuções históricas e sociológicas. Disponível em: <<http://coral.ufsm.br/gepeis/wp-content/uploads/2011/08/infancias.pdf>>. Acesso em: 03 de junho de 2013.

SANTOS, Aretusa; LAURO, Bianca Recker. Infância, criança e diversidade: proposta e análise. Disponível em:<<http://www.ufjf.br/virtu/files/2010/04/artigo-2a23.pdf>>. Acesso em: 03 de junho de 2013.

SCOTTON, Maria Teresa. A representação da infância na poesia de Manoel de Barros-puc-rj. Disponível em:<<http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt07/t075.pdf>>. Acesso em 03 de junho de 2013.

Crédito da imagem:

http://cronicasdadeny.blogspot.com.br/2009/10/infancia-roubada.html

Título e texto adaptado por: Camila Dias

*Data original da publicação: 24 de agosto de 2013

Ano: 
2013